Manifesto da Fale pela preservação do Programa de Extensão Casas de Cultura do Espaço Cultural


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Este manifesto foi produzido por Conselheiros e Conselheiras da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Alagoas e tem como objetivo reivindicar a preservação do Programa das Casas de Cultura do Espaço Cultural desta Universidade. Convidamos a sociedade alagoana a assiná-lo, especialmente aquelas pessoas conhecedoras do Programa das Casas de Cultura e/ou que já tenham cursado um dos diversos cursos ofertados neste espaço pela Faculdade de Letras. 

Há mais de 30 anos, as Casas de Cultura (Britânica, de Expressão Francesa, Latino Americana, Luso-Brasileira, Visuogestual, Alemã) promovem atividades de ensino-aprendizagem de línguas e culturas que mobilizam a comunidade local, promovem a cultura e os movimentos culturais de diversos países, e proporcionam o desenvolvimento de competências linguístico-culturais de membros/as da sociedade civil, especialmente aqueles/as estudantes matriculados/as e/ou egressos/as de escolas públicas, nosso principal público-alvo. O Programa se constitui, portanto, sobre os pilares de formação linguística, cultural e crítica, que proporcionam a solidez de um saber crítico sobre si e sobre o outro, na medida em que promove o contato entre o indivíduo e as diferentes manifestações linguísticas e culturais que possam existir nos mais diversos contextos de usos da linguagem por falantes de diferentes línguas. O Programa se revela, deste modo, como importante instrumento da promoção da diversidade linguística e intercultural para a sociedade alagoana. 

Até o ano de 2020, o programa das Casas de Cultura no Espaço Cultural da Universidade contava com 29 bolsas pagas a estudantes de graduação que, matriculados nas licenciaturas, atuavam como professores e professoras em formação inicial dos cursos ofertados à sociedade alagoana. Com a pandemia, as aulas foram temporariamente suspensas, o que levou os projetos vinculados ao Programa a desenvolverem atividades alternativas para que o vínculo com a sociedade fosse mantido. Como exemplo destas atividades, podemos citar a criação de páginas nas redes sociais para a popularização de conhecimentos linguístico-culturais, bem como cursos pontuais para a formação de professores (com temas que atravessaram a acessibilidade e inclusão no ensino de línguas, as novas tecnologias, as metodologias ativas, a gamificação). Contudo, começava a ficar nítido que novos contornos seriam dados ao Programa. No mesmo ano, foram registrados atrasos nos pagamentos de bolsas, somados à inviabilidade de retorno às atividades presenciais em decorrência de uma crise sanitária mundial. Por fim, todas as bolsas foram suspensas em 2021 e vimos, com estarrecimento e imensa tristeza, o estrangulamento de um Programa que por décadas prestou serviços à sociedade, bem como a imputação de uma situação de vulnerabilidade a toda a equipe de bolsistas que, repentinamente, tiveram suas bolsas cortadas - frise-se, em meio a uma pandemia que nada de positivo nos trouxe, quando pelo contrário, potencializou os já existentes abismos da desigualdade social que testemunhamos cotidianamente. 


Já em 2022, após praticamente um ano e meio de interrupção de atividades, algumas bolsas foram recuperadas - mas não em sua totalidade. O longo tempo de suspensão das bolsas, somados à crise sanitária provocada pela pandemia de COVID-19, culminou na perda de vínculo entre o Programa das Casas de Cultura e a sociedade. No segundo semestre de 2022, com algumas das bolsas recuperadas, recebemos também a notícia de que os cursos anteriormente ofertados em modalidade presencial seriam, na ocasião, ofertados na modalidade remota. Anunciava-se, ainda que de forma implícita, mais um dos contornos que o Programa ganharia. A modalidade remota, para além de não garantir a estudantes bolsistas em formação para a docência as condições necessárias de trabalho (estações de trabalho silenciosas, instrumentos com sistema operacional razoável, auxílio Internet, entre outras), impactaram diretamente um dos vínculos mais importantes do Programa: aquele construído por anos de dedicação com a população mais vulnerável, que não necessariamente dispõe dos instrumentos necessários para acompanhar atividades na modalidade remota. Não obstante esse cenário, cujos resultados não permitem negar o desmonte das Casas de Cultura do Espaço Cultural (nunca houve tão poucos inscritos e tão poucos concluintes dos cursos quanto em 2022, na modalidade remota), em 2023 as bolsas foram novamente suspensas e o Programa, uma vez mais, descontinuado, rompendo assim, e de forma abrupta, o vínculo que tentávamos reconstruir com a sociedade ainda que as condições a que as atividades foram submetidas não fossem as ideais.

Atrasos de bolsas, sua suspensão por mais de um ano, retomada e redução de bolsas, modalidade alternativa de atividades, desvinculação das atividades do Espaço Cultural, nova suspensão de bolsas: ficava cada vez mais claro que o programa das Casas de Cultura, em sua forma, não era uma prioridade para a gestão da Universidade Federal de Alagoas. Eis que nos deparamos, então, com novos contornos que nos ajudam a compreender ainda melhor esta conjuntura.

Há em curso um Projeto de Reposicionamento do Espaço Cultural, lugar em que as Casas de Cultura atuam, do qual, infelizmente, a Faculdade de Letras não foi convidada a participar. Não houve qualquer diálogo prévio ou concomitante à elaboração de sua proposta, embora a atual direção da Faculdade de Letras já tivesse pedido o envio do esboço do novo plano em meados de 2022, quando da visita de membros da Pró-Reitoria de Extensão à Fale, visita esta também a pedido da Direção e que vislumbrava, inclusive, a reativação das bolsas das Casas e discussão para melhores condições de trabalho. Tal pedido de envio do projeto nunca foi atendido e foi necessário ratificá-lo, formalmente, em setembro de 2022, via Processo Nº 23065.038571/2022-81.

Ao excluir a Faculdade de Letras da participação na tomada de decisão e contribuição nesse processo de restauração, bem como promover, uma vez mais, a suspensão das bolsas das Casas de Cultura, ferem-se os direitos de oportunidades de extensão universitária tanto de discentes da Faculdade de Letras, quanto de integrantes da sociedade civil que historicamente encontram no Programa uma, quando não a única, oportunidade de cursar uma língua estrangeira e/ou materna para melhor formação social, acadêmica, cultural-artística e científica,  visando às oportunidades de trabalho, inserção social, graduação e pós-graduação em território nacional e internacional, que exigem conhecimentos em uma segunda língua.

De forma paralela a este projeto de reposicionamento do Espaço Cultural, tramita na Universidade Federal de Alagoas uma minuta de resolução que trata de uma Política Cultural para a Universidade. É preciso que a sociedade alagoana tome conhecimento acerca dos possíveis impactos dessa política aos cursos de língua e cultura ofertados no contexto do Programa das Casas de Cultura. Nesse sentido, observa-se que, para além de não haver qualquer menção às Casas de Cultura enquanto Programa já consolidado em tal minuta, ela abre espaço para que o projeto venha a atender interesses privados, correndo o sério risco de romper definitivamente com qualquer perspectiva de ensino-aprendizagem de línguas e culturas voltados à formação cidadã. Os cursos, que nos últimos anos vinham sendo ofertados de forma gratuita, podem ganhar contornos que venham a atender interesses de mercado somente - como, por exemplo, cursos de língua para fins específicos para empresas que contratem este serviço e concorram ao uso das salas do Espaço Cultural para sua oferta. Estamos diante de um iminente fim do Programa das Casas de Cultura tal como o conhecemos, e tal como trouxe tantos benefícios à sociedade alagoana. Enfatizamos, neste momento, que a atuação das Casas de Cultura não se restringe a aulas de línguas em uma perspectiva de ensino de código, mas, antes, envolve estímulo às atividades artístico-culturais, que mobilizam a comunidade local, que promovem a cultura e os movimentos culturais, que proporcionam a solidez de um saber crítico sobre nós mesmos, nossos espaços e sobre o outro e seu espaço também.

Diante deste cenário tão dramático, manifestamo-nos para que o Programa seja de fato incorporado às ações culturais como uma ação de extensão contínua e imprescindível da Universidade Federal de Alagoas, com orçamento totalmente público, a fim de que possa seguir atendendo aquelas pessoas que mais precisam e se beneficiam de sua existência. Além disso, manifestamo-nos também pela participação ativa e absoluta da Faculdade de Letras em qualquer projeto de reposicionamento do Espaço Cultural, na medida em que este é um importante instrumento de conexão entre a Universidade e a sociedade através da Extensão Universitária, não podendo ficar à mercê de interesses escusos aos interesses públicos de uma sociedade que sempre viu no Programa das Casas de Cultura uma oportunidade de exercer sua cidadania.

 

Coordenações das Casas de Cultura do Espaço Cultural
Conselho da Faculdade de Letras

 

28 de abril de 2023

 

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